Sunday, May 27, 2007

Deus, Sexo e Futebol

Do meu grupo de amigos de infância, quando tinha eu 7, 8 anos, faziam parte alguns rapazes mais velhos. Embora o convívio passasse habitualmente pelo futebol, por vezes surgia à baila a conversa sobre raparigas. Recordo-me de numa delas o elemento mais velho do grupo ter referido que um adulto lhe explicara os gritos da mulher durante o acto sexual: estes não eram afinal uma manifestação de dor, mas sim de um conjunto complexo de emoções, de prazer. Com receio de parecer estúpido, concordei; lembro-me no entanto de não ter compreendido nada do que este meu amigo falava. Esta era uma questão que, a mim, ainda não se colocava. Se não era dor, porque gritava? Porque gemia? Se era prazer, não deveria antes sorrir? Eu só gritava quando tinha o joelho esfolado de uma queda, e quando gostava muito de alguma coisa, dava gargalhadas. Aquilo não fazia muito sentido.

Hoje, do meu pequeno grupo de amigos uma parte muito significativa é ateia. Hoje, quando lhes falo de Deus, não consigo deixar de me sentir um pouco como o meu amigo de infância. Tal como a minha sensibilidade ainda não estava desperta para a sexualidade, a maioria das pessoas que conheço parece fechar o “canal” que as poderia conduzir à transcendência, tudo tem de ser palpável, científico. Não sabem o que perdem. Tal como eu em míudo, convencido que estava que o melhor a que poderia aspirar era mesmo marcar um belo golo, como o Bebeto fazia no Vasco.

Thursday, May 24, 2007

Ainda a Tourada

Quem está contra a tourada apresenta, habitualmente, dois tipos de argumentos. O primeiro trata-se de um cert0 sentimento de compaixão pelo animal, o segundo consiste no desagrado pela celebração de uma festa realizada sobre a tortura que é imposta ao toiro.

Concentremo-nos então sobre o primeiro. Imagine que está mesmo muito preocupado com o bem-estar do animal, que não suporta que este seja torturado e que por isso mesmo a tourada deveria ser proibida. Não tem porém nada contra a morte do toiro, caso à sua carne fosse dado o mesmo destino que a de tantos outros animais. Muito bem. Imagine agora que as farpas desapareciam da tourada para dar lugar apenas à execução pública do animal, numa arena. Nesse caso, já não estaria contra a tourada? Muito provavelmente continuaria a opôr-se. Porquê? Porque não é o sofrimento do animal que verdadeiramente o interessa, é uma outra coisa. Se é contra a tourada e julga que o é porque gosta muito dos touros, está enganado. Não é por isso que deseja que as touradas sejam proibidas.

Passemos então ao segundo tipo de argumento. Aqui não é tanto o tratamento ao qual o animal é submetido aquilo que o choca, mas sim a finalidade para o qual este se destina. Inquieta-o sofrimento do animal, todo o espetáculo das farpas e do sangue mas, mais uma vez, não é essa a razão da sua indignação. Não é certamente contra a utilização de um primata numa experiência científica que permita descobrir a cura para uma doença como a SIDA, muito embora o tratamento ao qual o macaco é submetido seja de uma enorme violência. Ora, o problema todo reside apenas no facto de achar que seres humanos não devem gozar de um sofrimento que é imposto ao toiro. Não é o animal o centro da questão, mas a atitude humana perante esse mesmo animal.

Afirmar porém, que quem gosta de tourada, gosta do espectáculo porque existe um toiro que é torturado, só pode ser dito por alguém que, afinal, não a compreende. A praça de toiros não é povoada por uma mão cheia de homens e mulheres com olhos vermelhos e caudas pontiagudas, que rejubilam com cada gota de sangue vertida sobre a arena. A tourada é antes a celebração de um modo de vida, note que não estou a negar o sofrimento do animal, mas apenas a relembrá-lo que não é essa a razão pela qual as pessoas assistem a uma tourada. Se está muito preocupado porque vive numa sociedade onde pessoas vibram com o sangue vertido dos animais, fique descansado, não vive; não é numa praça de toiros que as vai encontrar.

Friday, May 18, 2007

A Tourada e a arrogância do puritanismo

Os animais não possuem direitos. Ou melhor, possuem, mas apenas enquanto algo que lhes é atribuído pelo Homem. Em si mesmo, em absoluto, eles não existem. Não existe no reino animal algo como a moral ou a ética, estas são intrínsicamente humanas.

Ao contrário do que defendem associações como a animal, a questão essencial da tourada não é se esta está certa ou não (esta é, aliás, uma pergunta absurda) mas antes se a convicção/valores dos defensores dos direitos dos animais deve ou não sobrepôr-se ao direito de alguns portugueses organizarem e participarem numa tourada.

A atitude deste tipo de associações resume-se assim a um puritanismo ingénuo, mas sobretudo arrogante, que coloca os animais, ou melhor, a sua convicção, à frente do respeito pela tradição e modo de viver de outros.

Friday, May 4, 2007

Ser jovem é ser da Quercus. Ser (mais)velho é ambicionar o purgatório

Para quem é da minha geração, esquerda e moda são palavras que se confundem, tal como igreja e mofo ou direita e betos. Assim sendo, a escolha racional de qualquer miúdo de 16 anos que quisesse aparentar ser um gajo fixe, consistia em colar uns autocolantes do Che na mochila. Aos 16 anos foi o que fiz.

Porém, caso ainda andasse de mochila (e ando, mas é daquelas que serve para levar o computador), não seria o Che que estaria lá colado mas, quem sabe, o Al-Gore. Bem, pensando melhor, não o Al Gore, isso seria maricas... mas talvez o título do seu documentário, rabiscado a caneta de tinta permanente, ou ainda melhor, o o logotipo da Quercus.

A questão da existência de limites do crescimento não é nova, é antes bastante velha. Já por diversas vezes estivémos condenados à extinção e, uma vez atrás da outra, lá o Homem foi capaz de ir fugindo ao seu triste destino. Para um economista, a resposta a estas crises sucessivas foram dadas pelo mercado e pela capacidade de adaptação dos hábitos sociais. Assim sendo, economicamente falando, porque razão deveríamos estar preocupados com este novo documentário? A resposta em duas linhas é mais ou menos esta: os problemas associados ao aquecimento global devem-se essencialmente a falhas de mercado, agravadas pela sua natureza transnacional.

É este último elemento que levaria o jovem Renato Rosa a escrever o nome do DVD na sua mochila. Porquê? Porque este carácter transnacional do problema tem suscitado uma nova utopia de unidade/solidariedade mundial entre povos, alegadamente essencial para este combate. Nas correntes mais extremistas há mesmo quem já proponha a criação de governos mundiais, que sejam efectivamente capazes de lidar com o problema e evitar assim a extinção da nossa espécie.

Com luta contra imperialismo capitalista e união final entre povos no mesmo pacote não há jovem que resista.

O único problema recorda-nos porém, a história, quando olhamos para trás para verificar que a cada sonho de paraíso na terra seguiu-se o inferno. Parecendo que não, o melhor mesmo é ficar pelo purgatório...